O desafio de um conto minúsculo. Letras, ideias, sensações, contidas no espaço exíguo – circunscritas, prisioneiras. Um pequeno espaço, para nele despejar um oceano inteiro de paixões secretas.
Mas não será como enxurrada, avalanche, enchente. Terá de ser gota a gota.
Na verdade, vivemos assim, todos nós. Espremidos num tempo que se esvai tão depressa, tentando a todo custo deixar nossos rastros sobre a terra.
Vivemos um conto mínimo.
Esse pequeno texto que está aí em cima foi o primeiro Conto Mínimo que escrevi na vida, no dia 29 de setembro de 1997 – há quase duas décadas, portanto. O texto saiu na Ilustrada, caderno de cultura do jornal Folha de S. Paulo, e o espaço que me fora reservado tinha a largura de uma coluna e apenas 12 centímetros de altura (o que incluía o título). Na tela do computador, eram seis, sete linhas no máximo. Quase um hai-kai.
Foram dois anos colaborando com a Folha, duas vezes por semana, até a estreia na Revista de Domingo do Jornal do Brasil, no dia 16 de maio de 1999. Ali, os Contos Mínimos ganhariam mais espaço – uma página inteira – e também mais repercussão, acabando por me fazer viver muitas experiências fortes com leitores e leitoras.
Numa delas, durante uma palestra no Centro Cultural Banco do Brasil, uma senhora me perguntou se eu tinha ideia da responsabilidade do escritor e de sua capacidade de transformar a vida das pessoas. Surpresa, sem saber bem o que responder, balbuciei alguma coisa. Mas ela continuou: disse que um texto meu a tirara de uma depressão e a fizera voltar a fazer algo que fazia antes – ler para pessoas cegas. Perguntei que texto era e ela, em resposta, começou a dizê-lo em voz alta. Sabia o Conto Mínimo inteiro de cor. Nunca mais esqueci essa cena.
Trocamos telefones e mantemos contatos esporádicos. Pois há poucos dias ela me ligou, para me convidar para o lançamento de seu quarto livro. Depois daquele encontro no CCBB, tinha começado a escrever. E não parou mais.
Esse tipo de contato direto com o leitor sempre me foi proporcionado pelos Contos Mínimos, porque a exposição na grande imprensa é muito maior e a resposta é mais imediata do que nos livros. Talvez por isso, os Contos Mínimos têm sido muito utilizados em provas e trabalhos escolares, tendo sido compilados em vários livros, o que sempre foi motivo de alegria para mim.
Em 2006, depois de sete anos no JB, os Contos Mínimos chegaram ao fim, porque o próprio jornal – tão importante, tão querido – já estava se acabando. Mas desde então, por todos os lugares do Brasil aonde vou, encontro pessoas que me falam daqueles textos, e perguntam: você não escreve mais?
Por isso, decidi voltar a escrevê-los, aqui, neste espaço. Espero ter a disciplina para fazê-los toda semana, sempre num dia certo, como era antigamente. E, em homenagem ao JB, acho que vou fazer isso sempre aos domingos.