Vão dizer que é choro de perdedor. Talvez seja mesmo. Ganhar é bom, não é? Nós não ganhamos. Não entramos na lista dos dez melhores espetáculos de teatro em 2015, feita pelo Globo.

Quando digo “nós”, refiro-me ao musical “Bilac vê estrelas”, que escrevi em parceria com Julia Romeu, com músicas (inéditas) de Nei Lopes. Um musical brasileiríssimo, que recebeu uma montanha de elogios em sua estreia no Teatro Sesc Ginástico, do Rio. “Bilac” ganhou seis indicações para o Prêmio Cesgranrio e uma para o Shell, sem falar no Prêmio Bibi Ferreira, de São Paulo, no qual teve sete indicações e levou dois prêmios – Melhor Musical Brasileiro e Melhor Música. O principal crítico do Globo, Macksen Luiz, deu ao nosso espetáculo a cotação “Ótimo”, coisa rara. E elogiou principalmente as músicas de Nei Lopes (e o que pode haver de mais fundamental em um musical?), dizendo: “São composições inspiradas, com letras inteligentes, plenamente integradas à ação e carregadas de humor e poesia. Um trabalho irretocável”. Mesmo assim, “Bilac” ficou fora da lista. Tudo bem, acontece. Não dá para reclamar. Ou dá?

Não pude deixar de ficar pensando no assunto, embora sob outro ângulo: será que “Bilac vê estrelas” já está meio esquecido, pelo fato de ter sido encenado em janeiro – isto é, há um ano? Será que tudo o que está mais próximo de nós tende a parecer maior, melhor, mais brilhante?

Porque no Brasil as coisas funcionam assim. Estamos sempre esquecendo hoje as lições que aprendemos ontem. Aquilo que aconteceu no mês passado, ou no semestre passado, tende a não existir mais. No ano passado, então, nem se fala. Não é à toa que, no Carnaval, são pouquíssimos os casos de escolas de samba que foram campeãs tendo desfilado no domingo. A campeã sempre, ou quase sempre, sai do desfile de segunda-feira. Porque, na segunda, o desfile de domingo já é uma lembrança esmaecida, que começa a se apagar.

Então, é isso. Se for choro de perdedor, paciência. Não ter entrado na lista do Globo pelo menos me fez refletir sobre o nosso imediatismo. Porque é mais do que sabido que somos um povo sem memória. Alguém ainda se lembra por que íamos às ruas, aos milhões, em junho de 2013? O que era mesmo que queríamos? O que estávamos pedindo? Para que estávamos ali? E nossos desejos – foram atendidos?

Em dezembro daquele ano, ao voltar de uma viagem à Alemanha, escrevi um artigo, aqui mesmo no Globo, que teve bastante repercussão. Tinha o título de “Somos um povo fútil?” e está no meu site para quem se interessar  (http://heloisaseixas.com.br/somos-um-povo-futil/). Nele, eu chamava atenção para nossa falta de amor ao passado, nossa superficialidade, nossa tendência a ser um país de modismos – que adora celulares, mas não lê livros; que viaja para ir às compras, e não aos museus; que planta uma academia de ginástica em cada esquina, mas tem poucas bibliotecas; que é um dos campeões mundiais de cirurgia plástica, mas está sempre por baixo nos índices de educação. Um país que tende sempre a deixar para trás tudo o que ficou para trás.

Talvez seja por isso que estamos como estamos.

 

Artigo publicado por mim em O Globo, dia 02/01/2016

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