Desde pequeno, ele gostava de colecionar coisas. Guardava, dentro de caixas e pastas, recortes de jornais sobre os mais diversos assuntos, com a sensação de que um dia precisaria pesquisar as informações ali armazenadas. Tinha também especial prazer em observar o comportamento dos mais velhos, dos muito velhos. Ainda muito criança, costumava sentar-se à porta da loja do pai e ali ficava, horas e horas, conversando com os fregueses que apareciam, todos homens feitos. Mas seu interesse maior recaía sobre um amigo da família, um senhor de 80 anos a quem chamava de avô. Dele, ouvia histórias sobre o Rio Antigo, sobre os fascínios e as malandragens da Lapa clássica, as festas nos salões e nas gafieiras, os primeiros banhos de mar nas praias quase desertas de Copacabana e Ipanema.

Adolescente, começou a colecionar objetos. Livros, discos, fotografias, folhetos. Tinha um faro instintivo para o valor das coisas antigas, um respeito visceral pelas lembranças do passado – sem que jamais tivesse sido ensinado a agir assim. Colecionava coisas antigas como se fossem brinquedos.

Adulto, tornou-se um pesquisador. Era capaz de ficar horas e horas dentro de uma biblioteca, um sebo ou um museu, ou mesmo passeando pelas ruas de casario antigo, no Centro da cidade, onde até o arredondado das pedras do calçamento o deixava comovido, por saber que por ali haviam pisado milhões de pés que não existiam mais. Assim como acontecera quando era criança, seus melhores amigos continuaram sendo homens mais velhos, com quem conversava de igual para igual, com os quais trocava experiências e ideias. E a quem ajudava, sempre que dele precisavam. Tinha um respeito enorme por aquelas pessoas que a sociedade parecia desprezar. Os velhos eram, para ele, a personificação da memória cultural e estética do homem. Deviam ser cultuados – nunca esquecidos.

E assim os anos se passaram. Até que ele próprio começou a envelhecer. Mas apenas externamente. Por paradoxal que fosse, sua convivência – pela vida inteira – com coisas e pessoas do passado parecia deixá-lo cada vez mais jovem, cada vez mais menino. Tornou a fazer coleções que fizera na infância – lápis, de caixas de fósforos, de álbuns de figurinhas –, redescobrindo prazeres que estavam esquecidos.

E um dia viu, numa fotografia, uma placa pregada na porta do quarto de Frank Sinatra (então, já muito velho), que virou seu lema definitivo. Dizia: “Aquele que morrer com mais brinquedos, ganha”.

 


Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Relacionados