As capas têm um colorido parecido e eles formam um par. São os dois livros de crônicas, um meu e o outro do Ruy Castro, que acabam de sair da gráfica. “O amigo do vento” (meu) e “A melancia quadrada” (do Ruy) foram publicados pela editora Moderna e são voltados para o público jovem.  A ideia de fazer esses dois livros surgiu durante a FLIP do ano passado, a partir de um encontro com a diretora da Moderna, Maristela Petrili, que nos fez o convite.

Os textos que eu e Ruy escrevemos, cada um no seu estilo, foram, em sua maioria, publicados em jornais e revistas e trazem reflexões sobre gente, bichos, vida moderna, tecnologia, literatura e outros assuntos. Os dois livros fazem parte do Projeto de Leitura da editora Moderna, que elaborou também uma apostila com recomendações para a leitura em sala de aula, incluindo propostas de atividades paralelas, como indicação de filmes, músicas, pesquisas e livros sobre assuntos correlatos.

Abaixo, trecho de uma das crônicas de “O amigo do vento” (O menino e a catedral):

“Estranho que entrassem na sala de jantar em dia de semana. Nunca faziam isso. Ouviu primeiro os passos, depois o ruído dos ferrolhos da janela, bem perto de onde estava. Continuou quieto (embaixo da mesa). Talvez fosse por causa da festa no dia seguinte. Com certeza iam abrir a sala para arejar. Agora, um barulho surdo, como um soco. em seguida, o estalo das janelas contra as paredes externas. E o sol inundou a sala, num segundo. O menino piscou os olhos, atordoado. Depois abriu-os bem. E sorriu, com surpresa. Um raio de sol varava a renda, despejando-se no chão, onde estava ajoelhado. A luz, incidindo sobre o tecido do forro, tornara cor de pêssego o ar à sua volta, onde voejavam grãos de poeira, como se fossem pássaros num templo abandonado. Seu pequeno mundo – o mundo onde as coisas existiam pelo avesso – brilhava.”

E trecho de uma das crônicas de “A melancia quadrada” (O ovo na legalidade):

“É a mais completa reabilitação de um suposto criminoso na história da humanidade. O ovo – o querido ovo, fruto da galinha (às vezes, com participação do galo como astro convidado), objeto cujo design é uma maravilha de projeto e acabamento –, volta ao círculo social depois de décadas como inimigo público número 1. Durante quase toda a segunda metade do século XX, médicos e cientistas dedicaram-se a acusar o ovo dos piores crimes contra o coração e a responsabilizá-lo pela elevação dos níveis de colesterol a placares de basquete americano. Quem fosse cardíaco, não chegasse perto; quem não fosse, idem, para prevenir. Às galinhas, só restava submeter-se ao holocausto reservado à sua espécie e ao opróbrio para o seu produto.”

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